UMBANDA, VISÃO DA MORTE

Historicamente podemos entender ciência e a religião como antagônicas… Eu acredito que o verdadeiro sentimento religioso é o mais forte e nobre incentivo à pesquisa científica” (Albert Einstein)

Quando falamos sobre a morte, é importante compreendermos como cada indivíduo, como a sociedade em que ele está inserido e como a religião que ele professa, a compreendem. A crença religiosa professada pelo indivíduo é muito importante, pois é por meio dessa crença que ele fará a interpretação deste advento.

Dando continuidade aos posts sobre a compreensão da morte em determinadas religiões, abordaremos neste post a Umbanda. Exploraremos como os fiéis dessa religião se relacionam com a realidade da morte. Buscaremos compreender o significado de seus rituais, uma vez que estes diferem da maioria das religiões de cunho cristão.A

A Umbanda é uma religião brasileira fundada há mais de 100 anos, no estado do Rio de Janeiro.

Umbanda deriva do termo “quimbundo” (angolense) que quer dizer curandeiro. O marco inicial da Umbanda é a manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas no médium Zélio Fernandino de Morais, em 1908, diferenciando-a do Espiritismo, dos Cultos de Nação e Candomblé. Portanto, é uma religião sincrética que absorveu conceitos, atitudes e princípios cristãos, indígenas e afros, pois estas três culturas religiosas estão na sua base teológica e são visíveis em suas práticas. Nos dias atuais a Umbanda possui várias ramificações como, por exemplo, Umbanda Popular, Branca, de Caboclo e Sagrada.

A Umbanda prega a existência de um Deus único e tem nessa sua crença o seu maior fundamento religioso. Contudo, a Umbanda prega que as divindades de Deus (os Orixás) são seres divinos dotados de faculdades e poderes superiores aos dos espíritos e tem neles um dos seus fundamentos religiosos. Os Caboclos são as entidades mais importantes por se tratarem de verdadeiros guias que orientam e conduzem os fiéis.

O culto umbandista é realizado em templos, terreiros ou centros apropriados para o encontro dos praticantes onde entoam cânticos e fazem uso de instrumentos musicais como o atabaque. O culto é presidido por um chefe masculino ou feminino. Durante as sessões são realizadas consultas de apoio e orientação a quem recorre ao terreiro, práticas mediúnicas com incorporações de entidades espirituais e outros rituais.

A Umbanda não recorre aos sacrifícios de animais para assentamento de Orixás. Na Umbanda, as oferendas se caracterizam por flores, frutos, alimentos e velas como reverência às divindades. A fé é o mecanismo íntimo que ativa Deus (Olorum), suas Divindades e os Guias Espirituais em benefício dos médiuns e dos frequentadores dos seus templos.

A Umbanda não acredita em um céu ou num inferno, como nos cultos católico, judaico e muçulmano, mas sim que há regiões umbralinas, onde o espírito é recolhido para purgar os seus crimes, e uma vez arrependido dos mesmos, é então enviado a outras regiões onde possa evoluir espiritualmente. Após um período, que varia conforme cada caso, ele pode então reencarnar, a fim de resgatar, suas faltas, e progredir. A Umbanda acredita na reencarnação, onde através de sucessivas vidas em um mesmo ou outro orbe, vamos evoluindo espiritualmente, ao mesmo tempo que colaboramos para o aprimoramento de toda a criação divina. Os umbandistas chamam alma quando o espírito habita o corpo de carne, e espírito quando perde este envoltório.

Na interpretação da Umbanda a morte do corpo físico não é o fim da vida. Entende-se apenas como o fim de um ciclo, e este será encaminhado para uma esfera espiritual condizente com seus atos e vibração emocional acumulada durante a passagem no corpo físico. A Umbanda tem na cerimônia fúnebre a preocupação de garantir que o espírito desencarnado fique a cargo da Lei Divina e não tenha problemas maiores com ataques de espíritos negativos. Na Umbanda, morte e nascimento são momentos sagrados. O objetivo maior do nascimento e da morte é a harmonização e a evolução consciente do espírito. Após a morte, o ser humano leva consigo suas alegrias, sua fé, suas crenças, suas mágoas e suas dores.

Para compreendermos um pouco sobre os ritos de passagem da Umbanda, eu tive a honra de entrevistar a Tradutora Mãe Dinan Sátyro, Sacerdote da Umbanda Sagrada, sobre questões que permeiam este tema. Abaixo seguem os principais pontos da entrevista.

Como os umbandistas compreendem a morte? Qual o seu significado?

Entendemos a morte como um retorno do espírito à pátria espiritual. Significa que nossa missão nesta encarnação se encerrou.

Quais são os rituais de passagem do mundo material para o mundo espiritual?

Pai Omulú (senhor da morte) corta o cordão de prata que liga o corpo material ao corpo espiritual, quando então há o desencarne. O desencarnado é conduzido ao Pai Obaluaiê (senhor da evolução), que direciona o espírito a passar então por um portal de luz, onde irá reviver suas obras durante esta encarnação na Terra, e será julgado pelas mesmas.

O funeral umbandista é dividido em duas partes. Quais são?

A Umbanda tem o seu ritual próprio de funeral, que muda de um terreiro para outro. De forma geral, há a purificação do corpo com incenso, água sagrada e óleos. O corpo do desencarnado é ungido com óleos apropriados para que se crie uma aura positiva protegendo-o, e na urna funerária são traçados símbolos mágicos de proteção espiritual.

Antes do enterro ou cremação, o sacerdote pronuncia algumas palavras de conforto a todos os que estão no velório, e também sobre as virtudes do umbandista desencarnado. Após o túmulo ser coberto de terra e as flores serem depositadas sobre ele o sacerdote ministrante deve cerca-la com pemba ralada criando um círculo protetor a sua volta, e deve acender quatro velas brancas, uma acima da cabeça, um abaixo dos pés, uma do lado direito e outra do lado esquerdo formando uma cruz.

Qual o papel e a importância do Orixá Omulú?

Pai Omulú é o “senhor da morte”, aquele que rege os cemitérios, guardando para Olorum todos os espíritos caídos, que fraquejaram.

Os umbandistas acreditam em reencarnação?

A Umbanda admite a reencarnação, com o mesmo significado do Espiritismo de Allan Kardec, como um retorno do espírito à verdadeira pátria.

Os adeptos da Umbanda podem ser cremados?

O desencarnado umbandista pode ser cremado ou enterrado, pois seu verdadeiro ser, o espírito, não mais habita aquele corpo de carne.

Dentre os rituais ligados à morte o que os familiares fazem com os pertences da pessoa que morreu?

Os elementos que o umbandista usou em vida durante os rituais religiosos, como as suas guias, podem ser depositadas junto ao seu corpo no caixão. Ou depositados em outro local, conforme orientação do sacerdote responsável pelo terreiro que ele frequentava.

Como é vivenciado o processo de luto pelos familiares e amigos?

O luto dos familiares e amigos é o mesmo que o de qualquer outra religião, com dor pela perda, porém sem revolta, lembrando que o espírito é imortal, e que assim como nosso Criador Olorum, nunca tivemos início e nunca teremos fim. E nos reencontraremos na pátria espiritual, ou em alguma outra reencarnação.

Compreender a linguagem simbólica das religiões de tradições afro-brasileiras é de suma importância para que possamos oferecer um melhor cuidado aos nossos pacientes, principalmente os pacientes que estão em final de vida.


Saravá!


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